O direito à propriedade resulta do fato de que a vida humana é uma vida
material; de que os bens materiais necessários à vida do homem precisam ser
produzidos pelo esforço humano e que produzir é uma decisão individual.
O
direito à propriedade é o reconhecimento do fato de que o homem precisa identificar suas necessidades e agir
para criar as coisas que as saciam. Pensamento e ação, para o fim de
sustentar sua própria vida, não são automáticos. Em uma sociedade em que
está exposto a ter o resultado de seu trabalho tomado por qualquer um, o
homem é reduzido ao estado de um animal — que sobrevive apenas enquanto
for capaz de fisicamente defender os materiais que requer para
sobreviver.
O entendimento claro do direito à propriedade, assim
como o do direito à vida, requer entender que os verdadeiros direitos
representam limitações à ação de outros, nunca obrigações para que ajam
em seu favor. É por isso que não existe conflito entre os direitos de
uma pessoa e das outras com quem convive. Uma definição clara do direito
à propriedade é:
O direito à propriedade é o direito de não ter sua propriedade tirada pela ação de outro.
A discussão sobre o direito de propriedade depende inteiramente
das definições dos termos que usamos. Para garantir a clareza, vamos
desenvolver estes conceitos fundamentais.
Os materiais
Na
natureza existem materiais. O Sol, uma pedra, a atmosfera, uma árvore.
São coisas, sem propósito – elas simplesmente existem. Estas coisas, em
si, não têm qualquer significado especial. Elas simplesmente são.
Introduzimos no contexto o homem, reconhecendo sua natureza material. A
existência do homem é física e, como tal, é condicional ao meio material
em que ele vive.
Às condições materiais necessárias para a vida
humana, significando aqui sua existência corporal e também a capacidade
de exercer sua natureza racional, pode-se chamar de “necessidades
humanas”. O homem precisa preservar e desenvolver seu corpo. Precisa
respirar, comer, se abrigar da chuva e do sol, do frio e do calor,
proteger se de predadores e parasitas. O homem precisa preservar e
desenvolver sua mente, pois é só através dela que ele é capaz de suprir
suas necessidades físicas. O homem precisa aprender, comunicar-se,
descobrir, inventar, entreter-se e tudo o mais que enaltece sua mente.
Os
materiais presentes na natureza e as necessidades humanas são fatos.
Isoladamente, continuam sendo meras constatações sem maior significado.
Mas conhecendo estes fatos, é possível identificar uma associação: há
materiais que têm uma relação causal com a saciedade de uma necessidade
humana. A atmosfera permite ao homem respirar. Um pedaço de carne ou uma
fatia de pão podem ser usados para saciar a fome. Uma casa pode ser
usada para abrigar-se do sol e da chuva, roupas para proteger-se do frio
e uma piscina ou ar-condicionado para aliviar o calor. Papel e caneta,
livros, rádio, televisão e a Internet para libertar e ampliar o poder de
sua mente.
Os valores materiais
Se
“materiais” são as coisas que existem na natureza e “necessidades
humanas” são as condições físicas necessárias para nossa sobrevivência,
existe uma categoria especial de “materiais”: aqueles que são úteis à
vida humana, os que têm uma relação causal com a saciedade de uma ou
mais de nossas necessidades. A estes materiais chamamos “valores
materiais” ou “bens”.
O ar, a água, carne, pão, casas, roupas,
piscinas, ar-condicionado, papel, caneta, livros são todos valores
materiais — é fácil reconhecer que cada um destes serve para atender uma
ou mais das necessidades humanas. O que precisa ser destacado é que
materiais não atendem a necessidades automaticamente — apenas o fazem
através da ação humana.
A ação humana como fonte dos valores materiais
Desde
o material mais banal e abundante, é a ação humana que o transforma em
um valor material, um bem. O próprio ar que respiramos de nada nos serve
sem a ação de inspirar e expirar — uma das pouquíssimas ações que
realizamos automaticamente. O fato de que esta ação é fundamental ao
valor do ar é facilmente reconhecível ao observar o que acontece quando
nosso mecanismo automático de respiração falha — pode-se morrer sufocado
enquanto rodeado de ar por todos os lados.
Para que um material
seja um valor ele precisa ser conhecido, uma ou mais necessidades
humanas precisam ser identificadas, a relação causal entre o uso daquele
material e o atendimento da necessidade humana precisa ser conhecida e o
uso do material para aquele fim precisa ser praticável.
Talvez
exista um material que cura o câncer com 100% de sucesso. Mesmo que
exista, como não o conhecemos, ele não é um valor. Pode ser que o
material que cura o câncer já seja conhecido, mas que sua propriedade
medicinal não tenha sido descoberta – a não ser que saibamos como usá-lo
para nossos fins, o material não é um valor.
Conhecer tal
material também seria inútil se ainda não tivéssemos descoberto o
câncer, achando que doenças e morte são causados por “maus espíritos”.
Sem conhecer a real necessidade humana, o material não é um valor. Por
fim, poderíamos descobrir o material que cura o câncer e como usá-lo. Se
o único lugar onde ele puder ser encontrado for o centro do planeta
Júpiter, este material não é um valor — não até que possamos ir lá obtê-lo.
A
identificação de necessidades humanas, a identificação de materiais, a
descoberta das relações causais entre o uso dos materiais e a saciedade
das necessidades humanas e, finalmente, a obtenção dos materiais e seu
uso são todos exemplos da ação humana. Sem ação humana não há valores materiais: há apenas coisas inúteis e necessidades sem solução.
O direito aos valores criados
A
ação humana é voluntária. À exceção de ações biológicas básicas como a
respiração, tudo o que o homem faz é por sua decisão. O homem age para
saciar suas necessidades, o resultado desta ação são valores materiais —
valores que não existiriam sem sua intervenção.
O direito à
propriedade é reconhecer estes fatos: que sem a ação do homem não há
valores, que quando uma pessoa age e produz valores o fez para promover
sua vida, que ao fazê-lo criou algo que não existia antes, que tem
direito a usar os valores que criou para seus próprios propósitos.
A definição de "propriedade"
Visto
então o que são materiais, o que são valores e como a natureza do homem
e dos valores resulta no reconhecimento do direito à propriedade, falta
uma definição fundamental. O que é “propriedade”?
O direito à
propriedade é o direito de usar aquilo que se produz para os próprios
fins. Propriedade, portanto, é tudo aquilo sobre o que um indivíduo tem
liberdade para usar plenamente — a seu critério. Ao dizer “isto é meu”, o
que se está dizendo é “posso fazer com isto o que eu quiser”.
Propriedade
é a liberdade de se usar algo como se bem entende, independentemente do
consentimento alheio. O direito à propriedade, portanto, provém da
natureza dos valores materiais — eles precisam ser criados pela ação
humana e o homem precisa estar livre para usar o que cria.
Nota: O direito à propriedade, num sentido mais amplo, é tão fundamental que alguns reconhecem apenas ele e dele derivam todos os demais. A vida é um direito por ser algo que o indivíduo tem; a liberdade é ela própria um elemento da propriedade: o dono de algo é livre para usá-lo da forma que bem entender (desde que não interfira na propriedade de outro), e esse algo inclui tanto nossas propriedades num sentido mais estrito (como casas, carros, terrenos e bens em geral) quanto nosso próprio corpo e vida — auto-propriedade: cada um é dono de si mesmo, ninguém é dono de outro.
Posts da série:
- Direitos Sociais: aqueles que você paga mas não leva
- "Saúde não é direito humano". E daí?
- Direitos Legítimos (1): introdução
- Direitos Legítimos (2): Garantias x Liberdades / Direitos Positivos x Negativos
- Direitos Legítimos (3): a natureza humana
- Direitos Legítimos (4): Direitos como liberdades
- Direitos Legítimos (5): Vida
- Direitos Legítimos (6): Propriedade
- Leis antifumo - banindo a liberdade
- Direitos Legítimos (7): Liberdade
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Fonte: ocapitalista.com
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