domingo, 15 de dezembro de 2013

O estado quer que você o conheça. Isso é bom?


Como a educação é frequentemente apontada como a panaceia de todos os males por si mesma, sem maiores considerações, dificilmente alguém será contra qualquer proposta que adicione matérias à grade curricular, ou seja, "mais educação".

Pois bem, essa semana o Deputado Federal Romário apresentou projeto de Lei que inclui o estudo da Constituição Federal nos ensinos fundamental e médio. (Links: inteiro teor do projeto de lei | tramitação do projeto).

Façamos então estas maiores considerações:

O quê, exatamente, um aluno vai estudar ao ler a Constituição Federal?
A CF possui, basicamente, duas partes: uma que define os direitos dos cidadãos e outra que estabelece a estrutura política e jurídica do estado que vai fornecer isso.

A justificativa do Deputado é que é importante que nossos estudantes conheçam seus direitos para poder reivindicá-los. É exatamente o que comentei no post Educação pública sim; estatal não.: em vez de ensinar o valor do esforço próprio e da reivindicação de liberdade para poder exercê-lo, nossa educação se esforça em promover a ideia de que "cidadania é exigir direitos ao estado".

Quando se reivindica os mundos e fundos que a CF promete em seu art. 6º, especialmente, não se está reivindicando direitos e sim bens. É isso que educação, saúde, moradia, lazer, etc. são: bens, que precisam ser produzidos por uns para serem dados a outros. Nossa CF, como é da tradição socialdemocrata, consiste em fomentar a ilusão do estado como aquele arranjo em que todos vão viver às custas dos outros.

O estudo da Constituição, assim, é fundamental para nossas crianças aprenderem, agora do ponto de vista da lógica jurídica e legalista, aquilo que já foi ensinado à geração atual só como valores: que ser cidadão é se tornar um pedinte que sai por aí reivindicando que o estado lhe dê coisas.

A próxima geração, portanto, contará com pessoas que serão treinadas a pedir em juridiquês também. No que depender da nossa educação, nada mudará no teor das reivindicações — as pessoas continuarão protestando contra o sintoma (os 20 centavos) em vez de contra a causa (o sistema de concessão estatal no transporte público), por exemplo — mas agora saberão apontar também um embasamento legal para sua burrice.

Pode-se argumentar que o estudo da CF é importante porque o cidadão comum nem sequer está consciente de seus direitos.

É verdade, mas isto nos leva a outro ponto interessante:

O estado promete tudo a todos, não precisa atender a parcela de cidadãos comuns porque estes nem sabem dos direitos que têm, e mesmo assim o estado não consegue cumprir o que promete. O dia em que todos souberem dos seus direitos, a coisa tende a desandar de vez. Por exemplo, o dinheiro necessário para atender a demanda de apenas 4 pacientes do Ceará que pediram o cumprimento real do que foi prometido na CF na saúde ("a saúde é direito de todos e dever do Estado") corresponde a 67% do valor repassado pelo governo estadual para a compra de medicamentos básicos do município de Fortaleza inteiro. (Você pode ler mais sobre isso aqui: O Paciente de 800 mil reais.)

A solução, obviamente, não é manter as pessoas ignorantes quanto aos direitos prometidos, é PARAR de prometer essas mentiras impossíveis de serem cumpridas.

Este tipo de conclusão, no entanto, precisa de um enfoque CRÍTICO no estudo da Constituição para ser alcançada — enfoque absolutamente necessário, mas que não está nem de longe nos objetivos trazidos pela proposta do Deputado.

Ora, até Paulo Freire já dizia que é muita ingenuidade esperar que a classe dominante vá fornecer as ferramentas para a classe dominada reagir. O estado não vai fomentar a crítica a si mesmo ao ensinar a Constituição, e sim proporcionar que as crianças saibam apontar, agora com base na lei, o quanto e como devemos recorrer a ele para resolver nossas vidas.



Posts relevantes sobre o assunto:
- Educação pública sim; estatal não.
Uma proposta para melhorar a educação no país

- Direitos Sociais: aqueles que você paga mas não leva
- "Saúde não é direito humano". E daí?
Estes 2 posts abordam a natureza dos direitos sociais e a consequente impossibilidade de cumpri-los.


- Concessões e regulamentação: deveríamos mesmo comemorar a ação da ANATEL?
Uma explicação sobre a causa dos problemas na prestação de vários dos "direitos" prometidos.

sábado, 14 de dezembro de 2013

Mais sobre telecomunicações: o caso da Guatemala

No post sobre Concessões e regulamentação falamos sobre os problemas do setor de telecomunicações brasileiro, e como eles são causados pelo sistema de concessão adotado pelo governo, que permite que um pequeno grupo de empresas privadas conquiste o "direito" de explorar os serviços de telefonia numa área por determinado tempo, sendo protegidas pelo estado da entrada de novas concorrentes.

Mas como deveria ser feito este processo? Felizmente existe um caso real na Guatemala, em que as ideias capitalistas foram aplicadas. A história inicial é simples e praticamente idêntica à do Brasil, em termos proporcionais: em 1995, havia 11 milhões de habitantes no país e apenas 289 mil linhas telefônicas. Um novo presidente foi eleito e nomeou para a direção da estatal telefônica um economista de formação libertária, Alfredo Guzmán, graduado na Universidad Francisco Marroquin, atual centro austríaco da América Latina (graduandos de lá fazem matérias obrigatórias que utilizam Mises e Hayek como bibliografia).

Ao nomear Guzmán, o presidente recém-eleito da Guatemala lhe fez um único pedido: "Quero muitos telefones por todo o país. E rápido!". Vejam com Guzmán resolveu a situação:



Resumindo os pontos importantes: o mercado foi aberto para absolutamente toda e qualquer empresa, nacional ou estrangeira. Qualquer empresa, de qualquer país, que quisesse ir ofertar seus serviços na Guatemala tinha a total liberdade de fazê-lo. Sem qualquer restrição governamental. Não haveria privilégios, nem subsídios e nem restrições à livre concorrência.

Esta é a diferença entre um livre mercado e um sistema de concessão como o que temos no Brasil atualmente.

Quanto aos resultados, a Guatemala tem atualmente uma população de 13 milhões de pessoas e mais de 18 milhões de telefones. Hoje em dia, até mesmo os mais pobres guatemaltecos tem telefones celular e aproveitam um serviço de alta qualidade por um preço relativamente baixo.

sábado, 30 de novembro de 2013

Capitalismo


Por Pedro Carleial (com edições)

A definição mais comum de Capitalismo é alguma variante de “um sistema econômico baseado na propriedade privada dos meios de produção”. Esta definição é equivocada por vários motivos.

- Em primeiro lugar, o direito à propriedade é um conceito político e não econômico. Trata-se de reconhecer que tudo o que tem valor para o homem é produto do esforço produtivo de alguém, e garantir ao criador de cada valor o direito de fazer o que quiser com aquilo que produziu.

- Em segundo lugar, a definição faz uma distinção irrelevante ao especificar a propriedade privada de meios de produção. Rigorosamente todo produto material do esforço humano é um meio de produção em potencial.

Mesmo um bem de consumo é um meio de produção – ele permanece totalmente inalterado da saída da fábrica, passando pelo operador logístico, pelo atacadista e pelo varejista. Mas cada um destes o usa para produzir valor: trazendo o produto para perto de quem o deseja.

E o bem de consumo de um é o meio de produção de outro. Uma pessoa pode usar o leite comprado no mercado para colocar em seu cafezinho. Outra usa o mesmo leite para fazer um bolo para vender.

Não existe distinção real entre “bem de consumo” e “meio de produção”. A distinção está apenas em como cada um usa um dado produto: para saciar suas próprias vontades ou para produzir algo que saciará as vontades de outros.

- Finalmente, apenas a garantia formal da propriedade privada é insuficiente. Nos regimes fascistas e no moderno “estado regulador” a propriedade é nominalmente privada – mas o governo determina o que se pode ou não fazer com ela. Na prática, esta violação da liberdade anula o direito à propriedade. O que significa ser “dono” de uma propriedade se você precisa da permissão de outro para usá-la?

Como surge o capitalismo?
Nos posts passados, falamos sobre os direitos a vida, liberdade e propriedade. O que aconteceria se tivéssemos uma sociedade em que a atuação do estado se limitasse a proteger estes 3 direitos de TODOS os cidadãos? Parafraseando John Lennon em sua "Imagine":

Imagine um mundo em que cada pessoa é dona daquilo que produz - direito à propriedade.

Imagine um mundo em que cada pessoa é livre para dispor daquilo que produz - direito à liberdade.

Imagine um mundo em que cada pessoa tem sua vida protegida, de forma a poder exercer os dois direitos acima - direito à vida.

A vida sob um governo legítimo, o que significa um governo que defenda estes direitos individuais, é uma vida em que se está livre da ameaça dos outros, mas se está inteiramente responsável pela própria vida. Se alguém quer ter propriedade, terá de produzi-la. Se não é capaz de produzir aquilo que quer, terá de produzir algo que os outros queiram – para poder trocar por aquilo que deseja. Porque existem o direito à liberdade e o direito à vida, ele não pode ameaçar nem coagir ninguém a ajudá-lo nem a saciar suas vontades, precisa convencer as pessoas a fazer o que quer que façam.

Um sistema onde as pessoas são donas daquilo que produzem e o trocam por comum acordo, não é sistema econômico nenhum. O Capitalismo é simplesmente o que acontece naturalmente quando as pessoas estão livres de ameaças contra seus direitos.

O “sistema" capitalista é, portanto, um mito. Não existe ninguém “organizando” nem ditando as coisas no Capitalismo. Não existe ninguém determinando quem deve fazer o quê. Não existe “sistema” exceto a proteção dos direitos individuais – e isto é um sistema político, e não um sistema econômico.

Quando não se pode obrigar alguém a lhe dar o que você quer, é preciso convencê-lo. O meio de fazer isso é trocando o que você quer e ele tem pelo que ele quer e você tem. O dinheiro é uma ferramenta que facilita estas trocas.

Quando se tem propriedade acumulada, é natural que se procure obter dela o maior benefício possível. Um meio de fazer isto é usando-a para a produção. O “acúmulo de capital” não é parte de um “sistema”, é apenas o que as pessoas fazem naturalmente para melhorar sua condição de vida no futuro.

Não existem “classes” no Capitalismo porque não há sistema no Capitalismo. Existem ricos e pobres da mesma forma que existem pessoas bonitas e feias, inteligentes e burras, empenhadas e folgadas. Cada um produz de acordo com sua capacidade – e para seu próprio proveito. A “desigualdade” é parte da natureza humana, e não algo "causado pelo sistema capitalista", como alegam alguns. (É claro que, assim como é da natureza humana haver feios e bonitos, burros e inteligentes e nem por isso vamos defender que as pessoas não possam buscar educação ou tratamentos estéticos, pode-se também buscar amenizar a desigualdade. A questão fundamental é que qualquer busca por isso deve ser feita sem violar os direitos de outros).

Como ninguém planeja nem impõe a estrutura econômica no Capitalismo, chamo-o de “organização econômica”, e não “sistema econômico”. O que caracteriza esta organização econômica é ser o resultado natural da livre ação de todos os indivíduos, quando lhe são assegurados os direitos individuais.

Portanto,

Capitalismo é a organização econômica que resulta do sistema político de direitos individuais à vida, propriedade e liberdade.

Neste blog, tomo a liberdade de chamar o próprio sistema político de Capitalismo – por ser inseparável dos efeitos econômicos conhecidos por este nome.

Uma vez compreendida essa ideia, veremos que praticamente toda a crítica anticapitalista na verdade vive de botar nas costas do capitalismo coisas que não são, absolutamente, capitalismo. Por exemplo, quando as pessoas reclamam que "No capitalismo os governos dão dinheiro da população para salvar os banqueiros", isso é realmente culpa do capitalismo? Vejamos: o capitalismo se baseia na propriedade privada. Como pode um sistema baseado em roubar dinheiro (propriedade) de uns para dar a outros ser capitalista? Não pode.

Os próximos posts serão dedicados a comentar este tipo de crítica equivocada, na série que vou batizar de "Bota na conta do Capitalismo", mas se você quiser expor questionamentos deste tipo (e certamente haverá muitos, pois passamos nossa vida ouvindo que o Capitalismo é raiz dos males do mundo), fique à vontade para usar o espaço dos Comentários, logo abaixo.


Antes, um adendo:

Como saber se uma economia é capitalista?
Como visto, o Capitalismo não é um sistema. A existência de bancos, empresários, indústrias, dinheiro, trabalho assalariado, juros, nada disto precisa ser estabelecido pelo governo. Todas estas coisas surgem no Capitalismo, mas não são elas que fazem de uma economia capitalista. Não se pode caracterizar o Capitalismo por seus sintomas, pois é possível estabelecer estas e outras instituições típicas do Capitalismo pela força governamental.

O Capitalismo só pode ser identificado por suas causas, ou seja, pelo sistema político que o origina. Em um dado contexto, se os agentes econômicos têm assegurados seus direitos individuais então suas relações produtivas são capitalistas. Na medida que seus direitos à vida, propriedade e liberdade são ameaçados, suas relações deixam de ser capitalistas.

No mundo de hoje não existe país que seja completamente Capitalista. Na história a nação que mais se aproximou deste sistema político foram os Estados Unidos da América, no século 19. O que se encontra hoje no mundo ocidental são grandes economias mistas, em que os direitos de propriedade e liberdade individual são violados pelos governos em maior ou menor grau.

No Brasil o governo interfere em praticamente todos os aspectos da vida do cidadão, violando rotineiramente seus direitos à propriedade e à liberdade. Além de roubar o cidadão diretamente através dos impostos, impõe um sem número de regras estabelecendo o que o indivíduo pode ou não pode fazer com aquilo que lhe pertence. O governo é dono da empresa que domina 90% da atividade petroquímica, regulamenta pesadamente a importação e exportação dos produtos, taxa abusivamente a compra e venda dos produtos e ainda se declara dono de toda a reserva mineral do país - se você achasse petróleo na “sua” terra, não poderia explorar!

Em contraste, não existe empresa governamental de maquiagem. Embora sem dúvida existam inúmeras regulamentações sobre produtos de estética, e eles sejam sujeitos a tributos e restrições de importação e exportação, não há regulação específica desta indústria. Existem grandes e pequenas empresas privadas, com os mais variados modelos de negócio.

Comparada com a indústria petroquímica, a indústria de cosméticos é muito mais capitalista: quem desenvolve, produz, comercializa, compra e usa cosméticos o faz com muito mais liberdade.

A privatização, ainda que em regime de concessão, das grandes estatais de telecomunicações no Brasil dá um contraste claro entre situações de menor ou maior Capitalismo. Enquanto era uma indústria estatal, a telefonia no Brasil era cara, ruim e tecnologicamente atrasada. Quando se passou a respeitar parcialmente a propriedade privada nesta indústria, ocorreu uma revolução na qualidade, acessibilidade e preço dos serviços.

Mas a telefonia no Brasil ainda não é capitalista. A permissão para atuar no mercado é por concessão governamental. Os serviços e preços são regulados pelo governo. O verdadeiro Capitalismo faria o que vemos hoje parecer tão atrasado quando nos parece hoje o velho sistema onde uma linha de telefone custava milhares de reais e demorava meses para ser instalada.

Onde existe Capitalismo no mundo de hoje? Não há um país que seja completamente capitalista, que defenda consistentemente os princípios do sistema político dos direitos individuais. Há, no entanto, países que se aproximam muito deste ideal, e outros que não o veem nem ao longe. Nos países mais livres, há setores da economia que são praticamente Capitalistas – em que por algum motivo o governo não interfere.

Como Capitalismo se identifica pela defesa de direitos, a liberdade é o melhor indicador de quanto um país é capitalista. A Heritage Foundation publica anualmente um índice de liberdade econômica, um bom indicador de quanto cada país se aproxima do Capitalismo.

O Brasil aparece em 100º lugar no ranking de 2013. Aqui há bancos, empresários, assalariados e tudo o mais. Em teoria existe a tal “propriedade privada dos meios de produção”. Mas aqui nunca houve Capitalismo.

domingo, 3 de novembro de 2013

200 países, 200 anos e 1 efeito curioso



Pobreza já teve um significado objetivo: pobre era quem não tinha condição de atender suas necessidades mais básicas. Os pobres de hoje em dia vivem melhor que os de antigamente e até melhor do que os ricos de séculos atrás.

Uma premissa básica dos anticapitalistas é ignorar que o status inicial de todo mundo, a igualdade de oportunidades inicial, já existe e é a pobreza. O vídeo ilustra esse ponto perfeitamente bem: no começo todos os países estavam no mesmo canto, igualmente pobres. O que vemos ao longo de 200 anos de estatísticas são países abandonando a pobreza inicial. É triste que alguns países ainda não os tenham alcançado no canto de cima do gráfico, mas a solução certamente não é recriminar ou tentar puxar de volta aqueles que se distanciaram de tal pobreza inicial.

No entanto, o fato de o capitalismo permitir que tantas pessoas estejam acima da pobreza objetiva parece, para certos críticos, apenas realçar o fato de que algumas pessoas ainda estão nessa condição. Gera-se assim um curioso efeito: quanto MENOS pobreza há, MAIS histeria se cria em volta dela.

sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Educação pública sim; estatal não.



Se há uma coisa que todo mundo concorda que deveria ser prioridade é a educação.
E se há uma coisa que quase ninguém faz é levar a discussão à etapa seguinte: EDUCAÇÃO EM QUÊ? E, o que vou discutir principalmente neste post: COMO?

A unanimidade talvez esteja justamente nisso. Todo mundo concorda porque é um conceito vago, cada um defendendo "educação" porque imagina como seria lindo se todo mundo recebesse a mesma educação que a dele.

E como é o estado e seus políticos que sempre aparecem prometendo coisas universais, gratuitas e de qualidade, é natural que as pessoas depositem na educação estatal seu sonho de "educação a todos".

Creio que eu não precise escrever muito para demonstrar como o ensino público brasileiro é ruim. Matérias como "Aluno do ensino médio na escola pública sabe menos que o do fundamental na particular" ilustram bem como a coisa anda.

É desse padrão de educação que queremos mais?

Certamente não. Mas como a discussão política no Brasil se resume à matrix de opções de esquerda, a revolta "contra tudo isso que está aí" se converte numa indignação que acaba pedindo ...mais estado — o que significa simplesmente pedir mais do veneno que está causando os problemas, na eterna esperança de que ele cumpra o que nos prometeu.

(Mentalidade que, aliás, nos é ensinada pela própria escola: quem aí não aprendeu que ser cidadão é cobrar do estado que ele lhe dê seus direitos? Em vez de ensinar o valor do esforço próprio, nossa educação forma pedintes e a crença no "almoço grátis". Não é de se espantar que as pessoas, vítimas de um péssimo transporte público à base de concessões estatais, tenham saído à rua contra os 20 centavos, mero sintoma, em vez de contra o sistema de concessões do governo, a causa. Nem é de se espantar que depois tenha chegado a fatura: 30% de aumento no IPTU para pagar a conta do ônibus.)

Pois bem, que outra alternativa temos? Como mudar isso?

O problema dos incentivos
Para muitos, a solução de mudança é que as pessoas mudem sua forma de agir. Acreditam que basta "a sociedade" fiscalizar, protestar e punir, até que os políticos e burocratas parem de roubar. Esta crença, de que o estado tem tudo pra dar certo e as pessoas é que estão erradas, é ingênua, e ignora a questão dos incentivos.

Enquanto no ensino privado uma escola que seja boa tem aumento de receita, no ensino governamental é o contrário – quanto pior a escola, mais fácil exigir mais dinheiro para consertá-la. Esta estrutura invertida de incentivos no longo prazo leva sempre à piora do serviço prestado. Recentemente houve esforços na tentativa de inverter isso. Agora escolas melhores recebem mais bônus, isto é, dinheiro público. O resultado prático dessa tentativa é a corrida das estatísticas: pergunte a qualquer professor da rede pública e ele lhe dirá que há pressão para manter as estatísticas de reprovação baixas — o que significa simplesmente que alunos ruins estão tendo que ser passados adiante mesmo não merecendo, tudo para não comprometer as estatísticas. Não é supresa alguma sermos um país de analfabetos funcionais.

Muito mais factível do que "a sociedade" passar o dia todo fiscalizando se cada centavo está sendo bem gasto, é adotar um sistema que tenha os incentivos corretos para a boa aplicação natural do dinheiro. Isso, por mais estranho que possa soar à nossa cultura anticapitalista, ocorre no sistema privado.


A questão da ajuda aos pobres
A primeira preocupação certamente virá na pergunta:

"Mas se todos tiverem que pagar pela escola, como os pobres vão ter educação??" 
Em primeiro lugar, é importante destacar que os pobres JÁ PAGAM pela escola. Os impostos usados para financiar estas benesses estatais estão embutidos por toda a economia, e pesam sobretudo no bolso dos mais pobres. Eles já pagam, e não recebem.

A objeção seguinte geralmente  vem na forma de algum slogan do tipo:

"Educação é direito, não é mercadoria!"
Isto é defendido apaixonadamente por políticos, educadores e intelectuais – mas estão errados.

Direitos verdadeiros são condições inerentes à existência do indivíduo racional. O indivíduo permanece vivo a menos que o matem, permanece livre a menos que o ameacem, permanece dono do que é seu a menos que o roubem. Direitos verdadeiros são coisas que todos têm por natureza, mas podem lhes ser tiradas. (isso já foi discutido em mais detalhes na série sobre direitos, veja no Índice)

A educação não é inerente à existência do indivíduo. Ao contrário da vida, propriedade e liberdade, o indivíduo não possui educação – a não ser que alguém o eduque. A educação não é, portanto, um direito. Respeitar os verdadeiros direitos requer apenas que não façamos nada contra o próximo. O “direito” à educação nos obrigaria a trabalhar para ele.

Produtos são aquelas coisas que são criadas pelo trabalho humano. Como diz a própria palavra, produtos são coisas produzidas pela ação humana. Educar exige conhecimento e didática. O educador precisa ele mesmo saber, o que resulta de seu próprio esforço, e precisa transmitir este conhecimento ao aluno – outra ação humana. O próprio aluno, por sua vez, também precisa se esforçar para aprender.

A educação de um indivíduo resulta sempre de seu próprio esforço. Quando não é um completo autodidata, resulta também do esforço de outros – sejam professores, palestrantes, autores, editores ou fabricantes de material didático. A educação é produzida pela ação de todas estas pessoas. A educação é um produto.

Solução: Resolvendo os incentivos
Uma educação privada, portanto paga, e opcional garante que só estarão na escola indivíduos que querem estudar – ou crianças cujos pais vêem real valor na educação de seus filhos. É disto que nasce o respeito ao professor.

Uma educação totalmente privada significa que as escolas precisam competir entre si para contratar bons professores. É disto que nasce a recompensa financeira adequada pelo serviço que prestam.

Uma educação totalmente privada significa que para ganhar mais dinheiro cada escola, cada diretor, cada professor, precisa oferecer um produto melhor — em vez de se focarem em politicagem e estatísticas para inglês ver. Assim como em toda atividade econômica, a liberdade de competição levará à constante melhoria da qualidade e redução do preço do produto. É disto que nasce o ensino barato e de qualidade.

Uma educação totalmente privada significa menos oportunidade para corrupção. O governo brasileiro, em suas diversas esferas, poderia reduzir suas despesas, cortando sua arrecadação, em 15 a 20%. Isto significa que até 200 bilhões de reais por ano deixariam de passar pelas mãos do governo. Aquilo que não passa pelo governo não pode ser desviado por políticos desonestos.

Solução: Pode existir educação pública sem ser estatal - Política de Vales
Por que não tornar privado o ensino governamental?
A maneira de fazer isto, diferente dos leilões e concessões que se costuma usar nas “privatizações” brasileiras, seria transferir a propriedade das escolas diretamente para seus funcionários.

Administradores e professores da rede governamental de ensino receberiam uma participação na propriedade da escola em que trabalham e as escolas passariam a ser de sua propriedade. Os termos específicos que regeriam estas sociedades precisam ser definidos, mas cada escola seria como qualquer empresa com vários sócios.

Toda a verba do orçamento do governo que era usada para custeio das escolas passaria imediatamente a ser distribuída à população em forma de “vales” – os pais de cada criança receberiam mensalmente um “vale” que poderiam usar no pagamento de qualquer escola. As escolas apresentariam os “vales” que receberam de seus alunos ao governo, que as pagaria em dinheiro. O valor do “vale” seria ajustado anualmente por um índice de inflação.

Um município que gasta R$2.000.000,00 por mês no custeio das escolas municipais e onde residem 10.000 crianças, por exemplo, passaria a distribuir mensalmente um vale de R$200,00 a cada criança. Ao matricular seu filho em uma escola que tivesse uma mensalidade de R$200,00 os pais poderiam simplesmente entregar o “vale” todo mês. Se a mensalidade fosse mais alta, pagariam a diferença.

Como a verba distribuída em “vales” é a mesma verba que as escolas governamentais recebiam, inicialmente haveria certa estabilidade. As escolas tornadas privadas poderiam inicialmente cobrar uma mensalidade exatamente igual ao valor do “vale”, mantendo os mesmos alunos e tendo uma receita próxima à que tinham antes.

Os “vales”, no entanto, seriam distribuídos a todas as crianças igualmente – como rege o princípio da igualdade perante a lei. Isto significa que crianças que atualmente cursam escolas privadas também receberiam “vales”.

Com o tempo as escolas recém tornadas privadas ajustariam seus preços à qualidade do serviço que prestam. Boas escolas poderiam cobrar mais que o valor do “vale”, escolas ruins teriam de oferecer melhores serviços para evitar que os pais transferissem seus filhos para outro lugar – levando consigo seu dinheiro.

É provável que muitos professores e administradores resolvessem vender suas partes nas escolas. No caso de escolas com imóveis em regiões nobres, é provável que o imóvel viesse a ser vendido. No entanto professores e administradores de escola têm um interesse direto na continuidade de seus próprios empregos. Mesmo que vendessem o prédio da escola, provavelmente reabririam em outro lugar. Se não reabrissem, todos os “vales” de seus ex-alunos acabariam em alguma outra escola.

Uma restrição à venda de imóveis ou outros ativos por um período de tempo poderia evitar a instabilidade da oferta de ensino durante a transição.

Proposta adicional: Transição
Este conjunto de medidas imediatas torna todo o sistema de ensino privado imediatamente, e a estrutura dos “vales” permite até que haja uma transição da dependência do governo para a responsabilidade individual de forma gradual, sem que uma geração de crianças precise pagar o preço pela irresponsabilidade de inúmeros governos e de seus próprios pais.

O período de transição para um eventual fim dos vales, poderia começar dez meses após a última escola governamental se tornar privada. Qualquer criança nascida a partir desta data não teria mais direito a “vale” educacional. Isto teria de ser amplamente e contundentemente anunciado. O período de dez meses é proposital – os pais saberiam antes de fazer o filho que teriam de pagar sua educação do próprio bolso.

Este modo de transição é melhor que uma redução gradual do valor do “vale”, pois deixa claro que a “ajuda” do governo vai acabar, e que os pais terão de assumir a responsabilidade pelos filhos que decidirem ter. Também evita que os vales se tornem permanentes – algo que será tentador para futuros governos socialistas.

Os obstáculos à proposta
Há milhões de crianças brasileiras freqüentando as escolas governamentais, a maioria de famílias pobres. Não existe ensino básico de baixo custo no país. Para eliminar o ensino governamental é preciso lidar com esta dependência estabelecida.

A ilusão de que o ensino governamental é gratuito é prevalente. A eliminação do ensino governamental será tratada politicamente como a eliminação de um benefício (sem reconhecer que elimina simultaneamente um malefício maior). Quem defender o ensino privado será atacado politicamente. Certamente será acusado de não valorizar a educação ou não se importar com o futuro das crianças brasileiras.

Estas acusações são falsas – o ensino totalmente privado certamente produziria ensino melhor, mais respeitado, mais barato e mais disponível no longo prazo. Mas é preciso lidar com a inevitável oposição política durante a transição.

A total privatização do ensino sofrerá oposição de muitas pessoas na máquina governamental, pois:

Elimina todo um ministério federal e secretarias em todos os governos estaduais e municipais; Faz com que professores e diretores de escolas precisem produzir bons resultados para manterem seus empregos e evoluírem na carreira; Elimina as oportunidades de corrupção em construção de escolas, compra de material escolar, compra de merenda escolar entre outras; Elimina a possibilidade do uso de gastos com educação como ferramenta de propaganda política; Elimina a possibilidade de uso da rede de ensino para doutrinação política.

Estes fatores indicam que se deve esperar a oposição de:

Burocratas de ministérios e secretarias de educação; Professores e diretores de escola que não querem ser avaliados por seus resultados; Sindicatos de professores; Empresários que vivem de fornecer para o governo (honesta ou desonestamente); Políticos e lobistas que se beneficiam de “facilitar” estes negócios; Políticos que usam a educação como ferramenta de propaganda e Grupos que querem usar as escolas para propagar sua ideologia em escala nacional.

É preciso evitar ou superar a oposição destas pessoas.

A cultura do estatismo torna a extinção do ensino governamental impopular. Os “beneficiários” do sistema se acostumam e passam a se achar no direito de receber serviços a troco de (aparentemente) nada. Em todas as classes econômicas predomina a idéia e que é responsabilidade do governo resolver os problemas dos cidadãos.

É preciso “vender” a solução liberal, mostrando em termos compreensíveis pela população em geral que o ensino totalmente privado funciona.

O método adicional proposto oferece ainda uma arma contra a cultura do estatismo. Com a transição feita da maneira proposta, e aliada à sua ampla divulgação, será possível dizer a quem no futuro vier reclamar que não pode pagar uma escola que sabia antes de fazer o filho que teria de arcar com esta responsabilidade, de forma que a pressão social passe a ser pela responsabilidade individual ao gerar crianças, em vez de pedir ao governo que assalte a uns para pagar a conta da irresponsabilidade de outros.

*O post acima aplicou trechos escritos por Pedro Carleial

segunda-feira, 12 de agosto de 2013

A maneira como pensamos em caridade está totalmente errada.

Ativista e Captador de Recursos, Dan Pallotta chama a atenção para os princípios contraditórios que baseiam nossa relação com as instituições de caridade. Muitas oraganizações filantrópicas, ele diz, são beneficiadas por gastarem tão pouco — não pelo que fazem. Em vez de igualar frugalidade com a moralidade, ele nos pede para que comecemos a compensar as insituições pelos seus objetivos grandes e grandes conquistas (mesmo que isso venha com grandes gastos). Nessa palestra corajosa, ele diz: Vamos mudar a maneira que pensamos em mudar o mundo.

Ou ainda: como a lógica de mercado pode ajudar a caridade.



Transcrição integral do vídeo:
Eu quero falar sobre inovação social e empreendedorismo social.

Eu por acaso tenho tri gêmeos. Eles são pequenos, têm 5 anos. Às vezes eu digo às pessoas que tenho tri gêmeos.

Elas dizem”, “Sério? Quantos?” Esta é uma foto deles. Essa é a Sage, e a Annalisa e Rider.

Agora, eu por acaso também sou gay. Ser gay e criar tri gêmeos são até agora a coisa mais inovadora socialmente, e empreendedora socialmente que eu já fiz. (Risos) (Aplausos)

A real inovação social da qual quero falar envolve caridade. Quero falar sobre como as coisas que nos ensinaram a pensar sobre doações e caridade e sobre as organizações sem fins lucrativos estão,na verdade, minando as causas que amamos e nosso profundo anseio de mudar o mundo. Mas antes que eu faça isso, eu quero perguntar se a gente acredita mesmo que o setor das organizações sem fins lucrativos tem algum papel na mudança do mundo. Muitas pessoas dizem que os negócios vão levantar as economias em desenvolvimento. e os negócios sociais vão tomar conta do resto. E eu acredito que os negócios vão mover adiante a grande massa de humanidade .

Mas isso sempre deixa pra trás aqueles 10% ou mais que tem menos vantagens ou menos sorte. E o negócio social precisa de mercados,e há algumas questões para as quais você não pode desenvolver o tipo de medidas de dinheiro que você precisa para um mercado. Eu faço parte da direção de um centro para portadores de deficiência mental, e essas pessoas querem risos e compaixão e querem amar. Como você monetiza isso? É aí que o setor de instituições sem fins lucrativos e a filantropia entram. Filantropia é o mercado para a amor.

É o mercado para todas aquelas pessoas para quem não há mercado. Então, se realmente quisermos, como Buckminster Fuller disse, um mundo que funciona para todos, sem ninguém deixado de fora, aí o setor sem fins lucrativos tem que ser uma parte séria da conversa. Mas não parece estar funcionando.

Por que nossas instituições de caridade de câncer de mama não estão perto de descobrir a cura, ou nossas instituições para os moradores de rua não estão perto de acabar com essa situação em qualquer grande cidade? Por que a pobreza permanceu em 12% da população americana por 40 anos? E a resposta é, esses problemas sociais são enormes em escala, nossas organizações são pequenas contra eles, e nós temos um sistema de crença que as mantém pequenas. Nós temos dois livros de regras.

Nós temos um para o setor sem fins lucrativos e um para o resto da economia mundial. É um apartheid, e que discrimina o setor sem fins lucrativos em cindo áreas diferentes, a primeira sendo remuneração. Então, neste setor, quanto mais valor você produzir, mais dinheiro você pode fazer. Mas nós não gostamos que essas entidades usem dinheiro para incentivar as pessoas a produzirem mais no serviço social. Nós reagimos de forma radical à ideia de que alguém esteja fazendo muito dinheiro ajudado as outras pessoas. Interessante que não reagimos dessa forma à ideia de que pessoas ganhariam muito dinheiro sem ajudar ninguém.

Sabem, você quer fazer 50 milhões de dólares vendendo jogos de video games violentos para crianças, vá em frente. Nós te colocaremos na capa da Revista Wired. Mas se você quer ganhar meio milhão de dólares tentando curar crianças com malária, e você é considerado um parasita. E nós pensamos nisso como nosso sistema de ética. mas o que nós não percebemos é que esse sistema tem um poderoso efeito colateral, que é, dá uma dura opção, mutualmente exclusiva entre fazer bem a você próprio e sua família ou fazer bem ao mundo para as mentes mais brilhantes saindo de nossas universidades, e manda dezenas de milhares de pessoas que podiam fazer uma enorme diferença no setor sem fins lucrativos marcharem todos os dias direto para o setor COM fins lucrativos porque elas não estão dispostas a fazer esse tipo de sacrifício econômico para os resto da vida Businessweek fez uma pesquisa, olhou para os pacotes de remuneração para os formados com MBA, 10 anos de formação em business, e o salário médio para um MBA de Stanford, com bônus, aos 38 anos, era 400.000 dólares. Enquanto isso, para o mesmo ano, o salário médio do CEO de uma instituição de caridade médica de $5 milhões de dólares nos EUA era de 232.000 dólares, e o de uma instituição contra a fome, 84.000 dólares.

Agora, não tem jeito de você fazer um monte de gente com um talento de 400.000 dólares, fazer um sacrifício de 316.000 dólares todo ano, para se tornarem o CEO de uma instituição de caridade contra a fome. Algumas pessoas dizem, “Bem, mas é porque esses tipinhos com MBA são muito gananciosos.” Não necessariamente. Eles podem ser espertos. É mais barato para esta pessoa doar cem mil dólares todo ano para essa instituição, economizando 50 mil dólares de imposto, assim ela ainda sairia ganhando 270 mil dólares a mais por ano nesse jogo, e ser chamada de filantropo porque doaram 100 mil dólares para caridade, provavelmente estar no conselho de administração dessa instituição, até mesmo, provavelmente até supervisionar o pobre SOB que decidiu se tornar o CEO da instituição, e ter uma vida inteira com esse tipo de poder e influência e popularidade ainda pela frente. A segunda área de discriminação é propaganda e marketing. Dizemos para o mercado privado com fins lucrativos, “gaste, gaste, gaste em propaganda até o último dólar não produzir mais um centavo de valor.” Mas nós não gostamos de ver nossas doações para fins beneficentes sendo gastas em propaganda Nossa atitude é, “Bem, olhe, se você conseguir uma doação para propagandas, sabe, às quatro da manhã, tudo bem para mim. Mas eu não quero minhas doações sendo gastas em publicidade. Eu quero que vá para os necessitados.” Como se o dinheiro investido na publicidade não pudesse trazer de volta somas muito grandes de dinheiro para servir aos necessitados.

Nos anos 90, minha companhia criou as longas viagens de bicicleta AIDSRide e as caminhadas do câncer de mama, de 60 milhas em três dias, e ao longo de nove anos, nós tivemos 182.000 heróis comuns participando, e eles arrecadaram um total de 581 milhões de dólares. Eles arrecadaram dinheiro mais rápido para essas causas que qualquer evento na história, tudo baseado na ideia de que pessoas estão cansadas de que lhes peçam que façam o mínimo que podem fazer. As pessoas estão ansiosas por medir a distancia toda de seu potencial em nome das causas com as quais se importam profundamente. Mas elas precisam ser convidadas.

Nós conseguimos este tanto de pessoas participantes comprando comercias de uma página inteira no New York Times, no Boston Globe, em comerciais de radio e TV. Sabem quantas pessoas teríamos conseguido se tivéssemos colocado cartazes nas lavanderias? Doações permaneceram paradas, nos EUA, nos 2% do rendimento interno bruto, desde que isso começou a ser medido, nos anos 70. Esse é um fato importante, porque nos diz que em 40 anos, o setor sem fins lucrativos não foi capaz de lutar contra nenhuma participação afastado do setor privado que visa lucro. E se você pensar nisso, como poderia um setor tirar a participação no mercado de outro setor se não é exatamente permitido no mercado? E se nós contarmos às marcas de consumo, ”Você pode anunciar todos os benefícios do seu produto,” mas nós dissermos às instituições, “Você não pode anunciar todo o bem que você faz,” para onde acha que o dinheiro do consumidor vai? A terceira área de discriminação é a tomada de risco em buscar novas ideias que geram rendimento. A Disney pode fazer um filme de 200 milhões de dólares que fracassa, e ninguém vai chamar o procurador geral. Mas se você faz uma captação de recursos comunitária de 1 milhão para os pobres, e não produz um lucro de 75% para a causa nos primeiros 12 meses, e seu caráter já é questionado.

Então as instituições são bem relutantes em tentar qualquer angariação de fundo inovadora, ousada, grande por medo de que se a coisa falhar, sua reputação será arrastada para a lama. Bem, nós sabemos que quando você proíbe a falha, você mata a inovação. Se você mata a inovação na captação de recurso, você não pode arrecadar mais recurso. Se você não pode arrecadar recurso, você não pode crescer. E se você não pode crescer, você não pode resolver grandes problemas sociais. A quarta área é tempo. A Amazon ficou seis anos sem devolver qualquer lucro para os investidores, e as pessoas tiveram paciência. Elas sabiam que havia um objetivo a longo prazo de construir domínio de mercado. Mas se uma organização beneficente tivesse um sonho de construir uma escala magnífica que fosse requerer 6 anos, nenhum dinheiro iria para os necessitados, seria todo investido em construir essa escala, esperaríamos uma crucificação. E a última área é o próprio lucro. As empresas privadas podem dar lucro as pessoas para atrair seu capital para suas novas ideias, mas você não pode ter lucros numa organização sem fins lucrativos, de modo que o setor de fins lucrativos tem um bloqueio nos mercados multi-trilhionários e o setor não lucrativo está faminto por crescimento e risco e capital ideal. Bem, você coloca essas cinco coisas juntas– você não pode usar dinheiro para atrair talento do setor com fins lucrativos, você não pode fazer propagandas como o setor privado faz para ter novos clientes, você não pode assumir os riscos na busca desses clientes que o setor privado assume, você não tem o mesmo tempo para achá-los como o setor privado,e você não tem um mercado de ações para financiar tudo isso, mesmo que você conseguisse, e você acaba de colocar o setor sem fins lucrativos em desvantagem para o setor privado em todos os níveis.

Se temos alguma dúvida sobre os efeitos desse livro de regras, essa estatística é preocupante: De 1970 até 2009, o número de organizações filantrópicas que realmente cresceram, que ultrapassaram a barreira de recurso de $50 milhões ao ano, é 144. Ao mesmo tempo, o número de empresas privadas que ultrapassaram isso é 46,136. Então, estamos lidando com problemas sociais que são enormes em escala, e nossas organizações não conseguem gerar uma escala. Tudo dessa escala vai para a Coca-Cola e para o Burger King. Então, por que pensamos dessa forma? Bem, como a maioria dos dogmas fanáticos na América, essas ideias vêm de velhas crenças Puritanas. Os Puritanos vieram por razões religiosas, pelo menos é o que dizem, mas eles também vieram porque queriam fazer muito dinheiro. Eles eram pessoas piedosas, mas também eram capitalistas bem agressivos, e foram acusados de formas extremas de tendências para ter lucro comparados a outros colonizadores. Mas ao mesmo tempo, os Puritanos eram Calvinistas, então eles foram ensinados a literalmente odiarem a si mesmos.

Foram ensinados que interesse próprio era como um mar furioso, que era um caminho certo para a condenação eterna. Bem, isso criou um problema grande para essas pessoas, certo? Aqui estão eles, que vieram para o outro lado do Atlântico para ganhar todo esse dinheiro. Ganhar esse dinheiro vai te fazer ir direto para o Inferno. O que eles poderiam fazer quanto a isso? Bem, caridade foi a resposta. Tornou-se um santuário econômico onde eles poderiam fazer penitência pelas suas tendências lucrativas a cinco centavos o dólar. Então, claro, como ganhar dinheiro na caridade se caridade era a penitência por ganhar dinheiro? Incentivo financeiro foi exilado do reino da ajuda ao próximo para que pudesse prosperar na área de obter dinheiro por si só, e em 400 anos, nada interveio para dizer, “Isso é contraproducente e isso é injusto.” Agora essa ideologia fica policiada por uma questão muito perigosa, que é, “Que porcentagem de minha doação vai para a causa versus despesas gerais?” Há muitos problemas com essa questão. Eu vou focar em apenas dois. Primeiro, isso nos faz pensar que as despesas gerais são uma coisa negativa, que não é, de alguma forma, parte da causa. Mas absolutamente é, especialmente se estiver sendo usado para crescimento.Agora, essa ideia de pensar nas despesas gerais como inimigas da causa cria o segundo, e muito maior, problema, que é o fato de forçar as organizações a continuarem sem as coisas gerais que realmente precisam para crescer, pelo interesse em manter as despesas baixas. Todos nós fomos ensinados que a filantropia deveria gastar o menos possível em despesas gerais, como captação de dinheiro sob a teoria que, bem, quanto menos dinheiro gastar para a captação de recursos, mais dinheiro estará disponível para a causa. Bem, isso é verdade se for um mundo deprimente no qual essa torta não pode ser feita maior. Mas, se for num mundo lógico no qual investir numa captação de recursos na verdade levanta mais fundos e faz a torta maior, aí nós estamos fazendo as coisas o contrário, e nós devemos investir mais dinheiro, não menos, nessa captação, porque isso é a única coisa que tem o potencial de multiplicar a quantidade de dinheiro disponível para a causa com a qual nos preocupamos profundamente. Vou dar exemplos. Nós lançamos a AIDSRides com um investimento inicial de 50.000 dólares no capital de risco. Em 9 anos, nós tínhamos multiplicado isso em 1.982 vezes em 108 milhões de dólares, depois de todas as despesas para serviços da AIDSRides Lançamos os três dias para o câncer de mama com um investimento inicial de 350.000 dólares em capital de risco. Em apenas 5 anos, nós tínhamos multiplicado isso 554 vezes em 194 milhões de dólares depois das despesas para as pesquisas em câncer de mama.

Agora, se você fosse um filantropo realmente interessado em câncer de mama, o que faria mais sentido: ir e achar o pesquisador mais inovador do mundo e dar a ele 350.000 dólares para pesquisa, ou dar ao departamento de captação de recursos estes 350.000 dólares para multiplicar isso em 194 milhões de dólares para a pesquisa em câncer de mama? 2002 foi nosso ano mais bem sucedido. Rendemos para o câncer de mama, só ele naquele ano, 71 milhões de dólares líquidos. E aí saimos do mercado, repentinamente e com traumas. Por quê? Bem, para encurtar, a história é que nosso patrocinador se separou da gente. Eles quiseram se distanciar de nós porque estávamos sendo crucificados pela mídia por investir 40% da renda bruta em contratações e serviço ao cliente e a magia da experiência e não há uma palavra mais aceitável para descrever esse tipo de investimento no crescimento e no futuro, senão esse rótulo demoníaco de despesas gerais. Então um dia, todos os nossos maravilhosos 350 empregados perderam seus empregos porque foram classificados como despesas gerais. Nosso patrocinador tentaram os eventos por conta própria. As despesas subiram. O lucro líquido para a pesquisa do câncer de mama caiu em 84%, ou 60 milhões de dólares ao ano. Isso é o que acontece quando confundimos moralidade com frugalidade.

Nós todos fomos ensinados que arrecadar recursos de forma amadora com 5% sobrecarga é moralmente superior a uma captação de recursos profissional com 40% sobrecarga mas estamos perdendo a informação mais importante, que é, qual é o tamanho verdadeiro disso? Quem se importa se o dinheiro conseguido vendendo tortas só é de 5%? E se só tivesse rendido 71 dólares para a causa de caridade porque não foi feito um investimento em sua escala e a captação profissional de recursos rendeu 71 milhões de dólares porque foi feito um investimento? Agora, que torta você prefere, e que torta você acha que os necessitados famintos iam preferir? Assim é que tudo isso impacta o mais global. Eu disse que doações eram 2% do PIB nos EUA. Isso é mais ou menos 300 bilhões de dólares por ano. Mas somente 20% disso, or 60 milhões, vai para as causas da saúde e direitos humanos. O resto vai para religião e educação superior e hospitais e esses 60 milhões não são nem de perto o suficiente para derrubar esses problemas. Mas se pudéssemos movimentar doações dos 2% do PIB para só um passo, para 3% do PIB, investindo nesse crescimento, isso significariam extra 150 milhões ao ano em contribuições, e se esse dinheiro pudesse ir desproporcionalmente para instituições de caridade de saúde e serviços humanos, porque são estes que encorajamos para investir em seu crescimento, isso representaria a triplicação das contribuições para o setor. Agora,estamos falando de escala. Agora estamos falando do potencial para verdadeira mudança. Mas nunca acontecerá forçando essas organizações a baixarem seus horizontes com o objetivo desmoralizante de manter a suas despesas baixas.

Nossa geração não quer ler um epitáfio ”Nós mantivemos o custo administrativo da caridade baixo” (Risos) (Aplausos) Nós queremos ler que mudamos o mundo, e que parte de como fizemos isso foi mudando a maneira como pensamos sobre essas coisas. Então, a próxima vez que estiver olhando para uma instituição de caridade, não pergunte sobre a variação dos custos administrativos. Pergunte sobre a escala de seus sonhos, uma escala de sonhos do nível Apple, Google, Amazon, como eles medem seu progresso em direção àqueles sonhos, e quais recursos eles precisam para fazer isso se tornar realidade não importa qual o tamanho do custo administrativo.

Quem se importa qual foram os custos se os problemas estiverem realmente sendo solucionados? Se nós pudermos ter esse tipo de generosidade, a do pensamento, o setor sem fins lucrativos pode desempenhar um papel gigante na mudança do mundo para todos os cidadãos em sua maior parte precisando desesperadamente de uma mudança. E se essa pode ser o legado de nossa geração, que nós nos responsabilizamos pelo pensamento que tinha sido entregue a nós, que nós o revisitamos, o revisamos, e reinventamos toda a maneira como a humanidade pensa em mudar as coisas, para sempre, para todo mundo, bem, eu achei melhor deixar as crianças resumir como isso seria.

Annalisa Smith-Pallotta: Isso seria – Sage Smith Palotta: — uma verdadeira – Rider Smith-Pallotta: — inovação social.

Dan Pallotta: Muito Obrigado. Obrigado. (Aplausos) Obrigado. (Aplausos)

sábado, 10 de agosto de 2013

A mentalidade da esquerda e seus estragos sobre os mais pobres

(por Thomas Sowell)

Quando adolescentes criminosos e assassinos são rotulados de "jovens problemáticos" por pessoas que se identificam como sendo de esquerda, isso nos diz mais sobre a mentalidade da própria esquerda do que sobre esses criminosos violentos propriamente ditos.

Raramente há alguma evidência de que os criminosos sejam meramente 'problemáticos', e frequentemente abundam evidências de que eles na realidade estão apenas se divertindo enormemente ao cometer seus atos criminosos sobre terceiros.

Por que então essa desculpa já arraigada? Por que rotular adolescentes criminosos de "jovens problemáticos" e supor que maníacos homicidas são meros "doentes"?

Pelo menos desde o século XVIII a esquerda vem se esforçando para não lidar com o simples fato de que a maldade existe — que algumas pessoas simplesmente optam por fazer coisas que elas sabem de antemão serem erradas. Todo o tipo de desculpa, desde pobreza até adolescência infeliz, é utilizada pela esquerda para explicar, justificar e isentar a maldade.

Todas as pessoas que saíram da pobreza ou que tiveram uma infância infeliz, ou ambas, e que se tornaram seres humanos decentes e produtivos, sem jamais praticarem atos violentos, são ignoradas pela esquerda, que também ignora o fato de que a maldade independe da renda e das origens, uma vez que ela também é cometida por gente criada na riqueza e no privilégio, como reis, conquistadores e escravocratas.

Logo, por que a existência do mal sempre foi um conceito tão difícil para ser aceito por muitos da esquerda? O objetivo básico da esquerda sempre foi o de mudar as condições externas da humanidade. Mas e se o problema for interno? E se o verdadeiro problema for a perversidade dos seres humanos?

Rousseau negou esta hipótese no século XVIII e a esquerda a vem negando desde então. Por quê? Autopreservação. Afinal, se as coisas que a esquerda quer controlar — instituições e políticas governamentais — não são os fatores definidores dos problemas do mundo, então qual função restaria à esquerda?

E se fatores como a família, a cultura e as tradições exercerem mais influência positiva do que as novas e iluminadas "soluções" governamentais que a esquerda está constantemente inventando? E se a busca pelas "raízes da criminalidade" não for nem minimamente tão eficaz quanto retirar criminosos de circulação? As estatísticas ao redor do mundo mostram que as taxas de homicídio estavam em declínio durante as décadas em que vigoravam as velhas e tradicionais práticas tão desdenhadas pela intelligentsia esquerdista. Já quando as novas e brilhantes ideias da esquerda ganharam influência, no final da década de 1960, a criminalidade e violência urbana dispararam.

O que houve quando ideias antiquadas sobre sexo foram substituídas, ainda na década de 1960, pelas novas e brilhantes ideias da esquerda, as quais foram introduzidas nas escolas sob a alcunha de "educação sexual" e que supostamente deveriam reduzir a gravidez na adolescência e as doenças sexualmente transmissíveis? Tanto a gravidez na adolescência quanto as doenças sexualmente transmissíveis vinham caindo havia anos. No entanto, esta tendência foi subitamente revertida na década de 1960 e atingiu recordes históricos.

Desarmamento

Uma das mais antigas e mais dogmáticas cruzadas da esquerda é aquela em prol do desarmamento. Aqui, novamente, o enfoque está nas questões externas — no caso, nas armas.

Se as armas de fato fossem o problema, então leis de controle de armas poderiam ser a resposta. Mas se o verdadeiro problema são aquelas pessoas malvadas que não se importam com a vida de outras pessoas — e nem muito menos para as leis —, então o desarmamento, na prática, fará apenas com que pessoas decentes e cumpridoras da lei se tornem ainda mais vulneráveis perante pessoas perversas.

Dado que a crença no desarmamento sempre foi uma grande característica da esquerda desde o século XVIII, em todos os países ao redor do mundo, seria de se imaginar que, a esta altura, já haveria incontáveis evidências dando sustentação a esta crença. No entanto, evidências de que o desarmamento de fato reduz as taxas de criminalidade em geral, ou as taxas de homicídio em particular, raramente são mencionadas por defensores do controle de armas. Simplesmente se pressupõe, de passagem, que é óbvio que leis mais rigorosas de controle de armas irão reduzir os homicídios e a criminalidade.

No entanto, a crua realidade não dá sustento a esta pressuposição. É por isso que são os críticos do desarmamento que se baseiam em evidências empíricas, todas elas magnificamente coletadas nos livros "More Guns, Less Crime", de John Lott, e "Guns and Violence", de Joyce Lee Malcolm. [Veja nossos artigos sobre desarmamento]. Mas que importância têm os fatos perante a visão inebriante e emotiva da esquerda?

Pobres

A esquerda sempre se arrogou a função de protetora dos "pobres". Está é uma de suas principais reivindicações morais para adquirir poder político. Porém, qual a real veracidade desta alegação?

É verdade que líderes de esquerda em vários países adotaram políticas assistencialistas que permitem aos pobres viverem mais confortavelmente em sua pobreza. Mas isso nos leva a uma questão fundamental: quem realmente são "os pobres"?

Se você se baseia em uma definição de pobreza inventada por burocratas, como aquela que inclui um número de indivíduos ou de famílias abaixo de algum nível de renda arbitrariamente estipulado pelo governo, então realmente é fácil conseguir estatísticas sobre "os pobres". Elas são rotineiramente divulgadas pela mídia e gostosamente adotadas por políticos. Mas será que tais estatísticas têm muita relação com a realidade?

Houve um tempo em que "pobreza" tinha um significado concreto — uma quantidade insuficiente de comida para se manter vivo, ou roupas e abrigos incapazes de proteger um indivíduo dos elementos da natureza. Hoje, "pobreza" significa qualquer coisa que os burocratas do governo, que inventam os critérios estatísticos, queiram que signifique. E eles têm todos os incentivos para definir pobreza de uma maneira que abranja um número suficientemente alto de pessoas, pois isso justifica mais gastos assistencialistas e, consequentemente, mais votos e mais poder político.

Em vários países do mundo, não são poucas as pessoas que são consideradas pobres, mas que, além de terem acesso a vários bens de consumo que outrora seriam considerados luxuosos — como televisão, computador e carro —, são também muito bem alimentadas (em alguns casos, até mesmo apresentam sobrepeso). No entanto, uma definição arbitrária de palavras e números concede a essas pessoas livre acesso ao dinheiro dos pagadores de impostos.

Esse tipo de "pobreza" pode facilmente vir a se tornar um modo de vida, não apenas para os "pobres" de hoje, mas também para seus filhos e netos.

Mesmo quando esses indivíduos classificados como "pobres" têm o potencial de se tornar membros produtivos da sociedade, a simples ameaça de perder os benefícios assistencialistas caso consigam um emprego funciona como uma espécie de "imposto implícito" sobre sua renda futura, imposto este que, em termos relativos, seria maior do que o imposto explícito que incide sobre o aumento da renda de um milionário.

Em suma, as políticas assistencialistas defendidas pela esquerda tornam a pobreza mais confortável ao mesmo tempo em que penalizam tentativas de se sair da pobreza. Exceto para aqueles que acreditam que algumas pessoas nascem predestinadas a serem pobres para sempre, o fato é que a agenda da esquerda é um desserviço para os mais pobres, bem como para toda a sociedade. Ao contrário do que outros dizem, a enorme quantia de dinheiro desperdiçada no aparato burocrático necessário para gerenciar todas as políticas sociais não é nem de longe o pior problema dessa questão.

Se o objetivo é retirar pessoas da pobreza, há vários exemplos encorajadores de indivíduos e de grupos que lograram este feito, e nos mais diferentes países do mundo.

Milhões de "chineses expatriados" emigraram da China completamente destituídos e quase sempre iletrados. E isso ocorreu ao longo dos séculos. Independentemente de para onde tenham ido — se para outros países do Sudeste Asiático ou para os EUA —, eles sempre começaram lá embaixo, aceitando empregos duros, sujos e frequentemente perigosos.

Mesmo sendo frequentemente mal pagos, estes chineses expatriados sempre trabalhavam duro e poupavam o pouco que recebiam. Era uma questão cultural. Vários deles conseguiram, com sua poupança, abrir pequenos empreendimentos comerciais. Por trabalharem longas horas e viverem frugalmente, eles foram capazes de transformar pequenos negócios em empreendimentos maiores e mais prósperos. Eles se esforçaram para dar a seus filhos a educação que eles próprios não conseguiram obter.

Já em 1994, os 57 milhões de chineses expatriados haviam criado praticamente a mesma riqueza que o bilhão de pessoas que viviam na China.

Variações deste padrão social podem ser encontradas nas histórias de judeus, armênios, libaneses e outros emigrantes que se estabeleceram em vários países ao redor do mundo — inicialmente pobres, foram crescendo ao longo de gerações até atingirem a prosperidade. Raramente recorreram ao governo, e quase sempre evitaram a política ao longo de sua ascensão social.

Tais grupos se concentraram em desenvolver aquilo que economistas chamam de "capital humano" — seus talentos, habilidades, aptidões e disciplina. Seus êxitos frequentemente ocorreram em decorrência daquela palavra que a esquerda raramente utiliza em seus círculos refinados: "trabalho".

Em praticamente todos os grupos sociais e étnicos, existem indivíduos que seguem padrões similares para ascenderem da pobreza à prosperidade. Mas o número desses indivíduos em cada grupo faz uma grande diferença para a prosperidade ou a pobreza destes grupos como um todo.

A agenda da esquerda — promover a inveja e o ressentimento ao mesmo tempo em que vocifera exigindo ter "direitos" sobre o que outras pessoas produziram — é um padrão que tem se difundido em vários países ao redor do mundo.

Esta agenda raramente teve êxito em retirar os pobres da pobreza. O que ela de fato logrou foi elevar a esquerda a cargos de poder e a posições de autoexaltação — ao mesmo tempo em que promovem políticas com resultados socialmente contraproducentes.

A arrogância

É difícil encontrar um esquerdista que ainda não tenha inventado uma nova "solução" para os "problemas" da sociedade. Com frequência, tem-se a impressão de que existem mais soluções do que problemas. A realidade, no entanto, é que vários dos problemas de hoje são resultado das soluções de ontem.

No cerne da visão de mundo da esquerda jaz a tácita presunção de que pessoas imbuídas de elevados ideais e princípios morais — como os esquerdistas — sabem como tomar decisões para outras pessoas de forma melhor e mais eficaz do que estas próprias pessoas.

Esta presunção arbitrária e infundada pode ser encontrada em praticamente todas as políticas e regulamentações criadas ao longo dos anos, desde renovação urbana até serviços de saúde. Pessoas que nunca gerenciaram nem sequer uma pequena farmácia — muito menos um hospital — saem por aí jubilosamente prescrevendo regras sobre como deve funcionar o sistema de saúde, impondo arbitrariamente seus caprichos e especificidades a médicos, hospitais, empresas farmacêuticas e planos de saúde.

Uma das várias cruzadas internacionais empreendidas por intrometidos de esquerda é a tentativa de limitar as horas de trabalho de pessoas de outros países — especialmente países pobres — em empresas operadas por corporações multinacionais. Um grupo de monitoramento internacional se autoatribuiu a tarefa de garantir que as pessoas na China não trabalhem mais do que as legalmente determinadas 49 horas por semana.

Por que grupos de monitoramento internacional, liderados por americanos e europeus abastados, imaginam ser capazes de saber o que é melhor para pessoas que são muito mais pobres do que eles, e que possuem muito menos opções, é um daqueles insondáveis mistérios que permeiam a intelligentsia.

Na condição de alguém que saiu de casa aos 17 anos de idade, sem ter se formado no colégio, sem experiência no mercado de trabalho, e sem habilidades específicas, passei vários anos de minha vida aprendendo da maneira mais difícil o que realmente é a pobreza. Um dos momentos mais felizes durante aqueles anos ocorreu durante um breve período em que trabalhei 60 horas por semana — 40 horas entregando telegramas durante o dia e 20 horas trabalhando meio período em uma oficina de usinagem à noite.

Por que eu estava feliz? Porque antes de encontrar estes dois empregos eu havia gasto semanas procurando desesperadamente qualquer emprego. Minha escassa poupança já havia evaporado e chegado literalmente ao meu último dólar quando finalmente encontrei o emprego de meio período à noite em uma oficina de usinagem.

Passei vários dias tendo de caminhar vários quilômetros da pensão em que morava no Harlem até a oficina de usinagem, que ficava imediatamente abaixo da Ponte do Brooklyn, e tudo para poupar este último dólar para poder comprar pão até finalmente chegar o dia de receber meu primeiro salário.

Quando então encontrei um emprego de período integral — entregar telegramas durante o dia —, o salário somado dos dois empregos era mais do que tudo que eu já havia ganhado antes. Foi só então que pude pagar a pensão, comer e utilizar o metrô para ir ao trabalho e voltar.

Além de tudo isso, ainda conseguia poupar um pouco para eventuais momentos difíceis. Ter me tornado capaz de fazer isso era, para mim, o mais próximo do nirvana a que já havia chegado. Para a minha sorte, naquela época não havia nenhum intrometido de esquerda querendo me impedir de trabalhar mais horas do que eu gostaria.

Havia um salário mínimo, mas, como o valor deste havia sido estipulado em 1938, e estávamos em 1949, seu valor já havia se tornado insignificante em decorrência da inflação. Por causa desta ausência de um salário mínimo efetivo, o desemprego entre adolescentes negros no ano de 1949, que foi um ano de recessão, era apenas uma fração do que viria a ser até mesmo durante os anos mais prósperos desde a década de 1960 até hoje.

À medida que os moralmente ungidos passaram a elevar o salário mínimo, a partir da década de 1950, o desemprego entre os adolescentes negros disparou. Hoje, já estamos tão acostumados a taxas tragicamente altas de desemprego neste grupo, que várias pessoas não fazem a mais mínima ideia de que as coisas nem sempre foram assim — e muito menos que foram as políticas da esquerda intrometida que geraram tais consequências catastróficas.

Não sei o que teria sido de mim caso tais políticas já estivessem em efeito em 1949 e houvessem me impedido de encontrar um emprego antes de meu último dólar ser gasto.

Minha experiência pessoal é apenas um pequeno exemplo do que ocorre quando suas opções são bastante limitadas. Os prósperos intrometidos da esquerda estão constantemente promovendo políticas — como encargos sociais e trabalhistas — que reduzem ainda mais as poucas opções existentes para os pobres. Quando não reduzem empregos, tais políticas afetam sobremaneira seus salários.

Parece que simplesmente não ocorre aos intrometidos que as corporações multinacionais estão expandindo as opções para os pobres dos países do terceiro mundo, ao passo que as políticas defendidas pela esquerda estão reduzindo suas opções.

Os salários pagos pelas multinacionais nos países pobres normalmente são muito mais altos do que os salários pagos pelos empregadores locais. Ademais, a experiência que os empregados ganham ao trabalhar em empresas modernas transforma-os em mão-de-obra mais valiosa, e fez com que na China, por exemplo, os salários passassem a subir a porcentagens de dois dígitos anualmente.

Nada é mais fácil para pessoas diplomadas do que imaginar que elas sabem mais do que os pobres sobre o que é melhor para eles próprios. Porém, como alguém certa vez disse, "um tolo pode vestir seu casaco com mais facilidade do que se pedisse a ajuda de um homem sábio para fazer isso por ele".

terça-feira, 2 de julho de 2013

Cura gay


"Miss the point": em inglês, a expressão significa falhar em entender a parte importante de alguma coisa. Não sei se existe uma expressão equivalente em português, mas a atual discussão da "cura gay" seria um bom exemplo dessa situação, em que pessoas se dispõem a discutir uma questão que tem solução, mas acabam discutindo um ponto que não é o importante pra chegar lá e apenas criam confusão.

Tudo começa com a Resolução 001/99, do Conselho Federal de Psicologia (CFP).
Art. 3° - os psicólogos não exercerão qualquer ação que favoreça a patologização de comportamentos ou práticas homoeróticas, nem adotarão ação coercitiva tendente a orientar homossexuais para tratamentos não solicitados.
           Parágrafo único - Os psicólogos não colaborarão com eventos e serviços que proponham tratamento e cura das homossexualidades.

Art. 4° - Os psicólogos não se pronunciarão, nem participarão de pronunciamentos públicos, nos meios de comunicação de massa, de modo a reforçar os preconceitos sociais existentes em relação aos homossexuais como portadores de qualquer desordem psíquica.
Em seguida temos o PDL 234/11 do Deputado João Campos, que propõe a sustação do parágrafo único e do artigo 4º da Resolução (coloridos em vermelho acima), ou seja, propõe que eles deixem de ser aplicados, deixem de ter efeito.

A defesa furada de Feliciano e o autoritarismo do Conselho
Nesse vídeo, Marco Feliciano argumenta que é a resolução do CFP que fala em “cura gay” e eles, da comissão, é que estão tirando a cura gay da lei, porque homossexualidade não é doença. Essa é uma das defesas mais ridículas que me lembro de ter visto. Feliciano quer fazer de conta que a mera menção a "cura gay" numa lei significaria algum tipo de preconceito ou endosso a essa prática por parte do CFP — ora, isso é uma asneira completa. Pela lógica capenga do pastor, o vídeo dele no youtube, intitulado "MARCO FELICIANO FALA TUDO DA CURA GAY", também fala "cura gay", então quer dizer que está endossando-a ou sendo preconceituoso?

A resolução fala em cura gay, sim, mas PROIBINDO-A, e não endossando-a. Ao retirar o item que fala em "cura gay" estão tirando a expressão da lei, sim, mas retirando junto a proibição de que ela seja feita. É mais ou menos como revogar algum artigo que VEDA a prática de tortura e falar “nossa, a lei falava em tortura, então como nós não apoiamos tortura, nós que fomos lá e tiramos da lei hehehe”.

Fala-se muito no "Não tem cura porque não é doença", mas a própria Organização Mundial de Saúde define saúde não apenas como a "ausência de doença", mas sim como "a situação de completo bem-estar físico, mental e social.", ou seja, mesmo uma pessoa não-doente ainda pode buscar tratamento para qualquer situação que esteja afetando seu bem-estar bio-psico-social. É por isso que ninguém precisa, por exemplo, estar com obesidade para procurar um nutricionista — e o parágrafo único proíbe justamente que psicólogos participem de "eventos e serviços que proponham TRATAMENTO e cura das homossexualidades".

Se a intenção do Conselho fosse apenas evitar o uso da palavra "cura", então a lei deveria proibir apenas a terminologia "cura" para o tratamento, e NÃO proibir até tratamentos voluntários de homossexualidade.

O truque do Conselho, assim, é colocar tudo no mesmo saco. Qualquer mudança de homossexualidade é tratada histericamente como se significasse achar que homossexualidade é doença. Não é. Algo não precisa ser doença pra poder ser tratado.

Já o parágrafo 4º proíbe até mesmo o psicólogo de "se pronunciar de modo a reforçar os preconceitos sociais existentes em relação aos homossexuais como portadores de qualquer desordem psíquica". Se a intenção dos religiosos fosse mesmo apenas manter a possibilidade de tratamento, mas mantendo que "não é doença" e que ninguém pode dizer que é, então eles não deveriam estar tentando sustar o artigo 4º.

O que fica claro é que nenhum dos dois lados toma ações condizentes com o que dizem defender. Isso porque ambos possuem sua própria agenda: de um lado o CFP, fortemente patrocinado pela militância GLBTTT, tentando proibir qualquer opinião relativa à sexualidade que não lhes agrade; do outro, os religiosos, procurando pretextos para negar direitos aos homossexuais.

Mas afinal, apesar das atitudes contraditórias de ambos os lados — que nos dão uma boa dica das motivações tortas deles para o que estão fazendo —, os artigos deveriam ser sustados ou não?

A questão real
A discussão "é doença ou não é, pode falar que é ou não pode, pode chamar de cura ou não" é o missing the point do assunto.

Trata-se ou cura-se aquilo que é POSSÍVEL de ser curado ou tratado, enfim, mudado. Aí sim achamos a questão fundamental: é POSSÍVEL mudar a sexualidade de alguém?

Há quem diga que sim, há quem diga que não. Há quem tenha feito a mudança e diga que não dá certo. Há os que fizeram o hoje se dizem mais felizes. Com que base podemos dizer que não estão ou que é só uma ilusão? Reduzir a sexualidade a "todo mundo nasce assim e tem que morrer assim" ou "a única fonte de insatisfação dessas pessoas é o preconceito" não parece sensato.

Há casos em que a homossexualidade pode sim ser derivada de uma condição puramente biológica — nasceu assim e pronto — sendo talvez impossível de ser mudada, mas em nem todos os casos as pessoas seriam homossexuais “de nascença”. Querer restringir o fenômeno a uma única causa e dizer que ela se aplica a todo mundo, a ponto de proibí-los de sequer tentar mudar, é algo irônico, vindo de quem se diz defensor da diversidade.

A questão central é: só porque há quem ache impossível não se pode com uma resolução proibir os que acham possível de oferecerem tal tratamento a quem queira tentá-lo, ambos agindo voluntariamente. O fato é que o parágrafo único faz justamente isso: proíbe os profissionais que se sintam capazes de fazer tal mudança de oferecê-la a um paciente que queira tentá-la.

Agora, quanto ao artigo 4º, se um psicólogo resolve defender a tese de que homossexualidade é sim uma desordem psíquica, mesmo que ele esteja errado ou que essa opinião fira a sensibilidade de algumas pessoas, qual o problema?

Em geral, as pessoas apontam 2 problemas:
1- "Na prática, se retirarem a proibição, isso vai endossar ou estimular as pessoas e a religião a tentarem curar gays!"
O religioso maluco fundamentalista que acha que homossexualidade é pecado ou doença pela sua crença JÁ tenta curar gays, independentemente do que diga ou deixe de dizer o CFP.

Temos 2 cenários então. No 1º, psicólogos são proibidos de oferecerem tratamento: só vai sobrar ao gay que queira tentar mudar sua sexualidade recorrer a um desses religiosos malucos ou a um psicólogo que fará a coisa clandestinamente (o que geralmente só maus profissionais aceitam fazer), ou se contentar em não ter tratamento nenhum.

No 2º, psicólogos são autorizados: o homossexual passa a ter a chance de lidar com um profissional que poderá orientá-lo de forma responsável, em vez de clandestina.

É óbvio que o cenário em que não há proibição é muito mais benéfico aos próprios homossexuais.

Além do mais, o fato de o tratamento ser permitido não obriga os profissionais a fazê-lo. Aqueles que acham impossível tal mudança de sexualidade poderão continuar não recomendando e não praticando tal tratamento. E um profissional que prometa tratamentos que não consegue cumprir continua sendo passível de ser processado por propaganda enganosa, charlatanismo ou mesmo estelionato.

2- "Eles não podem falar que é doença porque NÃO É!"
Ciência não é (ou não deve ser, pelo menos) uma área em que um grupo elege uma verdade X ou Y e proíbe-se daí em diante as pessoas de se manifestarem contrariamente a ela porque vai "incomodar algum grupo". Ainda mais numa área tão pouco dominada quanto a mente humana.

É sempre complicado reconhecer o direito de as pessoas dizerem coisas que consideramos absurdas, mas tem se mostrado mais complicado ainda quando um grupo reivindica a prerrogativa de determinar — ou "orientar", em nome de um "bem maior" — o que pode ser dito e o que não pode.

Concluindo
Os gays devem ter os mesmos direitos de todo mundo, inclusive de casar e adotar, inclusive o de não serem tratados contra a sua vontade — e o artigo 3º, que proíbe isso, continua valendo (até porque homosssexualidade não é uma condição que retire o discernimento da pessoa). A homossexualidade ser doença ou não em NADA deve afetar esses direitos, justamente porque as pessoas não têm "direitos gays" e sim direitos de humanos.

E eles não têm, assim como ninguém tem, o direito de estabelecer um tabu na ciência que impeça psicólogos de eventualmente darem uma opinião que não lhes agrade, muito menos o de proibir que um outro homossexual recorra a um tratamento que queira voluntariamente a ser dado por um profissional que se sinta apto a dá-lo.

O ponto central, portanto, é se é atribuição estatal proibir (com as mais lindas intenções sempre, claro...) indivíduos de interagirem voluntariamente, ou ainda eleger opiniões que não possam ser manifestadas.



Leitura interessante:
Argumento de Marisa Lobo aos deputados
Nesse texto, a psicóloga Marisa Lobo explica em detalhes as consequências negativas da Resolução, tanto para psicólogos quanto para homossexuais. Notem que ela defende que homossexualidade não seja doença, apenas que há casos em que é possível haver tratamento, e mesmo assim o Conselho Federal de Psicologia tenta cassar a licença dela usando a resolução.

quinta-feira, 13 de junho de 2013

Passagens de ônibus, Estádios de futebol e a inflação


Se você já se perguntou "Por que o governo simplesmente não imprime mais dinheiro e dá pras pessoas pobres?" ou acha que inflação é simplesmente "uma alta generalizada de preços"*, o texto a seguir, de Alexandre Versignassi, responde a todas essas questões de forma muito clara e fácil.


Para entender melhor o que está acontecendo na rua, imagine que você é o presidente de um país fictício. Aí você acorda um dia e resolve construir um estádio. Uma “arena”.

O dinheiro que o seu país fictício tem na mão não dá conta da obra. Mas tudo bem. Você é o rei aqui. É só mandar imprimir uns 600 milhões de dinheiros que a arena sai.

Esses dinheiros vão para bancar os blocos de concreto e o salário dos pedreiros. Eles recebem o dinheiro novo e começam a construção. Mas também começam a gastar a grana que estão recebendo. E isso é bom: se os caras vão comprar vinho, a demanda pela bebida aumenta e os vinicultores do seu país ganham uma motivação para produzir mais bebida. Com eles plantando mais e fazendo mais vinho o PIB da sua nação fictícia cresce. Imprimir dinheiro para construir estádio às vezes pode ser uma boa mesmo.

Mas e se houver mais dinheiro no mercado do que a capacidade de os vinicultores produzirem mais vinho? Eles vão leiloar as garrafas. Não num leilão propriamente dito, mas aumentando o preço. O valor de uma garrafa de vinho não é o que ela custou para ser produzida, mas o máximo que as pessoas estão dispostas a pagar por ela. E se muita gente estiver com muito dinheiro na mão, essa disposição para gastar mais vai existir.

Agora que o preço do vinho aumentou e os vinicultores estão ganhando o dobro, o que acontece? Vamos dizer que um desses vinicultores resolve aproveitar o momento bom nos negócios e vai construir uma casa nova, lindona. E sai para comprar o material de construção.

Só tem uma coisa. Não foi só o vinicultor que ganhou mais dinheiro no seu país fictício. Foi todo mundo envolvido na construção do estádio e todo mundo que vendeu coisas para eles. Tem bastante gente na jogada com os bolsos mais cheios. E algumas dessas pessoas podem ter a idéia de ampliar as casas delas também. Natural.

Então as empresas de material de construção vão receber mais pedidos do que podem dar conta. Com vários clientes novos e sem ter como aumentar a produção do dia para a noite, o cara do material de construção vai fazer o que? Vai botar o preço lá em cima, porque não é besta.

Mas espera um pouco. Você não tinha mandado imprimir 600 milhões de dinheiros para fazer um estádio? Mas e agora, que ainda não fizeram nem metade das arquibancadas e o material de construção já ficou mais caro? Lembre-se que o concreto subiu justamente por causa do dinheiro novo que você mandou fazer.

Mas, caramba, você tem que terminar a arena. A Copa das Confederações Fictícias está logo ali… Então você dá a ordem: “Manda imprimir mais 1 bilhão e termina logo essa joça”. Nisso, os fabricantes de material e os funcionários deles saem para comprar vinho… E a remarcação de preços começa de novo. Para quem vende o material de construção, tudo continua basicamente na mesma. O vinho ficou mais caro, mas eles estão recebendo mais dinheiro direto da sua mão.

Mas para outros habitantes do seu país fictício a situação complicou. É o caso dos operários que estão levantado o estádio. O salário deles continua na mesma, mas agora eles têm de trabalhar mais horas para comprar a mesma quantidade de vinho.

O que você fez, na prática, foi roubar os peões. Ao imprimir mais moeda, você diminuiu o poder de compra dos caras. Inflação é um jeito de o governo bater as carteiras dos governados.

Foi mais ou menos o que aconteceu no mundo real. Primeiro, deixaram as impressoras de dinheiro ligadas no máximo. Só para dar uma ideia: em junho de 2010, havia R$ 124 bilhões em cédulas girando no país. Agora, são R$ 171 bilhões. Quase 40% a mais. Essa torrente de dinheiro teve vários destinatários. Um deles foram os deputados, que aumentaram o próprio salário de R$ 16.500 para de R$ 26.700 em 2010, criando um efeito cascata que estufou os contracheques de TODOS os políticos do país, já que o salário dos deputados federais baliza os dos estaduais e dos vereadores. Parece banal. E até é. Menos irrelevante, porém, foi outro recebedor dos reais novos que não paravam de sair das impressoras: o BNDES, que irrigou nossa economia com R$ 600 bilhões nos últimos 4 anos. Parte desse dinheiro se transformou em bônus de executivo. Os executivos saíram para comprar vinho… Inflação. Em palavras mais precisas, o poder de compra da maioria começou a diminuir. Foi como se algumas notas tivessem se desmaterializado das carteiras deles.**

Algumas dessas carteiras, na verdade, sempre acabam mais ou menos protegidas. Quem pode mais tem mais acesso a aplicações que seguram melhor a bronca da inflação (fundos com taxas de administração baixas, CDBs que dão 100% do CDI…, depois falamos mais sobre isso). O ponto é que o pessoal dos andares de baixo é quem perde mais.

Isso deixa claro qual é o grande mal da inflação: ela aumenta a desigualdade. Não tem jeito. E esse tipo de cenário sempre foi o mais propício para revoltas (justificadas ou não; violentas ou não). Revoltas que começam com aquela gota a mais que faz o barril transbordar. Os centavos a mais no ônibus foram essa gota.



*Pelo que pudemos ver, definir a inflação como uma "alta generalizada de preços" é como definir uma febre como a "alta generalizada da temperatura". O aumento de preços, assim como o de temperatura, é um SINTOMA; a causa da inflação é na verdade o aumento da quantidade de dinheiro sem lastro em riqueza real, causada pelo próprio governo ao imprimir mais e mais dinheiro. É por isso também que não adianta só imprimir dinheiro para pagar contas.

**Se nos lembrarmos de que o capitalismo se caracteriza pelo respeito ao direito de PROPRIEDADE, fica fácil entender porque não tem nada de capitalismo em governos que causam inflação: eles estão lesando a propriedade de seus cidadãos!

Por fim, especificamente sobre a questão dos protestos, é lamentável que os manifestantes estejam protestando apenas contra os preços e a (falta de) qualidade do serviço, que são da mesma forma meros sintomas, causados pelo sistema de concessões — contra o qual não se está falando nada contra. Mas isso já foi discutido nesse post.